Durante a pandemia, o modelo flipped classroom (MFC) totalmente online constituiu-se como uma alternativa ao MFC híbrido. Para avaliar a adequação do MFC ao contexto online, desenvolveu-se um ciclo de investigação-ação com estudantes do ensino secundário português que conjugou aulas assíncronas com aulas síncronas. A configuração das aulas teve por base o modelo dos 5E: Engage, Explore, Explain, Elaborate e Evaluate. Os dados foram recolhidos através de um questionário e das interações dos estudantes nas atividades síncronas. Os resultados mostram que as aulas assíncronas despertaram o interesse dos estudantes pelo tema (Engage), permitindo-lhes adquirir uma compreensão inicial do tema (Explore) e demonstrar a aprendizagem adquirida (Explain). As aulas síncronas destacaram o papel ativo dos estudantes na resolução de problemas complexos em grupo e a ampliação das aprendizagens autónomas (Elaborate e Evaluate). Porém, no processo de ampliação das aprendizagens os estudantes apoiaram-se mais no feedback imediato do docente do que propriamente nos colegas de grupo. Os resultados do estudo confirmam que o MFC se adequa ao contexto online, promove a personalização das aprendizagens e o desenvolvimento da autonomia dos estudantes.
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Como Citar
Ribeirinha, T., Correia, M., & Silva, B. (2024). Perceções dos estudantes do ensino secundário sobre o modelo flipped classroom em contexto online. Revista de Estudios e Investigación en Psicología y Educación, 11(1). https://doi.org/10.17979/reipe.2024.11.1.10024
Teresa Ribeirinha, Instituto Politécnico de Santarém
Escola Superior de Educação, Instituto Politécnico de Santarém (https://www.ipsantarem.pt) e CIEQV - Centro de Investigação em Qualidade de Vida: https://www.cieqv.pt Santarém – Portugal
Marisa Correia, Instituto Politécnico de Santarém
Escola Superior de Educação, Instituto Politécnico de Santarém (https://www.ipsantarem.pt) e CIEQV - Centro de Investigação em Qualidade de Vida: https://www.cieqv.pt Santarém – Portugal
Bento Silva, Universidade do Minho
Instituto de Educação da Universidade do Minho e CIEd- Centro de Investigação em Educação: https://www.ie.uminho.pt) Braga – Portugal
Ribeirinha, Correia, and Silva: Perceções dos alunos do ensino secundário sobre o modelo flipped classroom em contexto
online*
Durante o encerramento das escolas, causado pela pandemia COVID-19, a transição do
processo de ensino aprendizagem para o contexto online foi a alternativa possível
às aulas presenciais. Neste ambiente de aprendizagem, vários fatores influenciam o
tempo que os alunos são capazes de se comprometer com as tarefas e a eficácia dos
seus esforços. Por um lado, os alunos valorizam o ambiente criado nas plataformas
de aprendizagem online, devido à quantidade significativa de interação gerada e às
oportunidades de compartilhar ideias e recursos com pares (). Por outro lado, eles podem distrair-se mais facilmente e apresentar dificuldades
em autorregularem a aprendizagem (). Além disso, alguns alunos percebem os ambientes virtuais como distantes, o que
implica isolamento, problemas de automotivação e uma redução de fontes de reforço
e incentivo ().
Um dos modelos que ganhou ênfase durante a pandemia foi o modelo Flipped Classroom (MFC) (), dado que empodera a presença do aluno no contexto online, ajudando-os a permanecer
envolvidos e motivados e melhorando as interações entre eles nos encontros síncronos
().
Na sua forma convencional, o MFC é um modelo de aprendizagem híbrido que desloca o
processo de transmissão de conhecimento factuais para ambientes virtuais (componente
pré-aula), reservando para o encontro com o professor e colegas os processos de expansão
de conhecimentos (aula) (). O modelo oferece aos alunos várias vantagens pedagógicas (): (1) permite flexibilidade de leitura, através da componente pré-aula, onde o conteúdo
pode ser disponibilizado em vários formatos para atender aos diferentes estilos de
aprendizagem dos alunos; (2) integra a tecnologia, permitindo aos alunos um maior
controlo da sua aprendizagem, quer através do ritmo e da frequência com que interagem
com os conteúdos bem como através do feedback recebido; (3) facilita a aprendizagem
ativa, proporcionando interações significativas com os colegas e o professor, o que
promove a aprendizagem cooperativa baseada na resolução de problemas.
Em contexto totalmente online, a implementação do MFC comtempla, também, as atividades
pré-aula e as atividades da aula. As atividades pré-aula decorrem do modo anteriormente
descrito, porém, as atividades da aula passam a realizar-se numa plataforma de videoconferência,
permitindo o encontro virtual de professor e alunos para ampliar as aprendizagens
iniciadas nas atividades pré-aula ().
Apesar de haver um amplo corpo de investigações sobre o MFC, são poucos os estudos
que investigam o modelo no contexto totalmente online, sendo a maioria desenvolvidos
no ensino superior (). Alguns estudos, revelam que o MFC produz efeitos positivos nas aprendizagens, concentração
e resultados académicos dos alunos em comparação a outros métodos de ensino online
(). Aumenta a responsabilidade dos alunos, o sentido de pertença, as interações e a
motivação para aprender no contexto online (). No entanto, os resultados de uma revisão sistemática sobre o MFC revelaram que
a falta de familiaridade dos alunos com a aprendizagem invertida online, a incapacidade
de gerir a carga de trabalho pré-aula, as emoções negativas, a falta de tempo adequado
para lidar com as atividades propostas em aula e a falta de envolvimento com as atividades
em grupo, constituem os principais desafios da sua implementação em contexto online
().
Dada a escassez de estudos sobre o MFC em contextos de ensino não superior e face
aos resultados inconsistentes sobre a sua adequação ao contexto totalmente online,
desenvolveu-se um ciclo de investigação-ação para avaliar a implementação do MFC numa
turma do ensino secundário português. O design da proposta a implementar alicerçou-se
no modelo dos 5E (). Um modelo que tem sido aplicado no design de atividades do MFC, sendo considerado
viável para organizar as atividades de aprendizagem pré-aula e em aula (; ).
Influenciado pela teoria construtivista da aprendizagem, o modelo dos 5E, incentiva
os alunos a interpretarem de forma independente questões ou fenómenos, em vez de lhes
ser explicitamente dito o que devem pensar pelos professores (). O modelo engloba uma sequência pedagógica para o planeamento de aulas que compreende
cinco fases – Engage (Envolver), Explore (Explorar) Explain (Explicar), Elaborate (Elaborar) e Evaluate (Avaliar). A fase envolver tem como objetivo o envolvimento do aluno no processo de aprendizagem, para tal,
é lhe apresentada uma situação problemática, fazendo uso de cenários do mundo real,
com o intuito de despertar a sua curiosidade e identificar os seus conhecimentos prévios.
Na fase seguinte, explorar, o professor atua como facilitador ou orientador, dando aos alunos tempo e oportunidade
para explorar o conteúdo e construir a sua própria compreensão sobre o assunto em
questão. Com a fase explicar pretende-se que o aluno demonstre as aprendizagens que desenvolveu nas fases anteriores.
Com base nessas explicações, o professor, se necessário, poderá introduzir terminologia
de maneira direta e explícita para facilitar a construção de conceitos. Na fase elaborar o aluno é desafiado a aprofundar e aplicar os conhecimentos adquiridos anteriormente
a novas situações. Nesta fase, o professor fornece informações mais detalhadas sobre
o conteúdo através de mini palestras e/ou discussões. A fase avaliar destina-se a monitorizar o domínio dos alunos sobre os conteúdos, podendo ser realizada
no início e ao longo das diferentes fases do modelo, através de avaliações formativas
ou poderá ser apenas realizada no final, após a fase de elaboração, assumindo um caráter
sumativo.
Estudos empíricos têm vindo a indicar que a utilização do modelo dos 5E tem impacto
benéfico na aprendizagem dos alunos, abrangendo o domínio dos conteúdos, raciocínio
científico, interesse e atitudes (; ).
Assim, as conclusões deste estudo visam informar sobre o potencial adaptativo do MFC
que, ao integrar no design instrucional do modelo dos 5E, poderá contribuir para melhorar
a eficácia da aprendizagem dos alunos no contexto online
Método
Participantes
Este estudo foi conduzido numa turma do 10. º ano composta por 22 alunos, sendo 10
do sexo feminino e 12 do sexo masculino, com uma média de idade de 15,05 anos, a frequentar
uma escola pública no norte de Portugal.
A aprovação para a realização do estudo foi concedida pela Comissão de Ética para
a Investigação em Ciências Sociais e Humanas da Universidade do Minho (CEICSH 107/2019)
e o documento de consentimento informado, esclarecido e livre para participação em
estudos de investigação foi preenchido por todos os participantes.
Instrumentos
Neste estudo foram recolhidos dados resultantes da aplicação de um questionário e
das interações dos alunos produzidas durante as aulas síncronas.
Para analisar as perceções dos alunos sobre o MFC implementado em contexto online
foi utilizado um questionário composto por questões de resposta aberta e de resposta
fechada, num total de 25 questões. Nas questões abertas era pedido aos alunos que
descrevessem aspetos positivos e negativos do MFC. Em 21 questões (itens de resposta
fechada) foi utilizada uma escala Likert de 5 pontos, onde o valor 1 indicou discordância
total e o 5 concordância total. Os 21 itens estavam distribuídos por duas dimensões:
a dimensão pedagógico-comunicativa (DIM PC) e a dimensão pessoal (DIM P). A DIM PC,
composta por oito itens, analisou o potencial dos recursos e estratégias pedagógicas
para transmitir informações/ conteúdos e influenciar a interação entre os participantes.
A DIM P incluiu 13 itens que abordavam aspetos de envolvimento do aluno (cognitivo,
comportamental e emocional), como, por exemplo, a compreensão, autonomia e satisfação.
A validação de conteúdo do questionário foi feita por três especialistas da Tecnologia
Educativa e foram testadas as características psicométricas do questionário. Os resultados
indicaram a existência de dois fatores que explicam 62.42% da variabilidade total
e uma boa confiabilidade global ( = .932; DIM PC = .740; DIM P = .972).
Os dados resultantes das interações dos alunos produzidas nas aulas síncronas foram
utilizados para determinar o número de interações produzidas pelos alunos nas diferentes
atividades de aprendizagem. Nesse sentido, selecionaram-se seis aulas síncronas que
foram gravadas com a permissão dos alunos e seus encarregados de educação para, posteriormente,
serem analisadas.
Procedimento
O presente estudo usou uma metodologia de Investigação-Ação (I-A) que, em âmbito escolar,
permite a experimentação de novas estratégias de ensino e aprendizagem, de modo a
adequar as experiências escolares às necessidades inerentes do contexto, contribuindo
assim para a inovação curricular (). O processo de I-A foi desenvolvido em quatro fases: planificação, ação, observação
e reflexão (). A primeira fase consistiu no desenvolvimento de um plano de ação para abordar um
problema relevante, que neste caso foi a transição do processo de ensino e aprendizagem
para o contexto totalmente online. Esse plano incluiu o design da ação, aspetos metodológicos
e protocolo de avaliação. Em seguida, a ação foi implementada e os seus efeitos foram
observados e registados. Seguidamente, ocorreu a fase de reflexão, na qual foram analisados
os resultados da ação e realizadas considerações sobre as práticas pedagógicas adotadas.
O estudo decorreu entre abril e junho de 2020, durante o período de encerramento das
escolas em Portugal devido à COVID-19. Durante esse período, para dar continuidade
ao processo de formação dos alunos na disciplina de Física e Química, implementou-se
uma proposta do MFC no formato totalmente online. Essa proposta foi desenhada tendo
em atenção as dimensões do modelo dos 5E e foi desenvolvida através de aulas assíncronas
(AAS), que decorriam na plataforma Edmodo®, e aulas síncronas (AS), que decorriam
na plataforma de vídeo conferência Zoom®. Durante as AAS, comtempladas no horário
da disciplina, os alunos deveriam explorar os materiais disponibilizados pela professora
na plataforma Edmodo e realizar as diferentes atividades propostas. Esses materiais
incluíam: um vídeo didático, com aproximadamente seis minutos de duração, que abordava
um conteúdo teórico através de uma situação problemática do quotidiano (Envolver); um conjunto de slides e textos que permitissem leituras complementares (Explorar). Após exploração dos materiais os alunos deveriam realizar uma síntese esquemática
dos conteúdos abordados (Explicar), colocar, na plataforma, uma questão endereçada a um colega sobre esses conteúdos
e responder a um quiz de monitorização com feedback imediato (Avaliar). As AS decorriam na plataforma Zoom® e estavam estruturadas em dois momentos de
aprendizagem com designs distintos. Assim, os primeiros minutos destinavam-se às boas-vindas,
ao diálogo informal e, seguidamente, eram aferidos os conteúdos da AAS, através de
atividades de pergunta e resposta (Q&A) (Explicar). Com base nas respostas dos alunos a professora introduzia terminologia de maneira
direta e explícita para facilitar a construção de conceitos. Nesta fase, fazia uso
das funcionalidades da plataforma Zoom®, como o compartilhamento de tela, quadros
brancos e canetas digitais. O momento seguinte era destinado ao trabalho em grupo,
os alunos eram distribuídos por salas simultâneas para realizarem um conjunto de atividades
que lhes permitiam aprofundar os conhecimentos, através da resolução de problemas
práticos associados à exploração de simulações (Explorar/Explicar/Elaborar). A professora movia-se entre salas secundárias para prestar apoio aos alunos. No
final, retomavam todos à sala principal para apresentar as principais conclusões que
eram comentadas pela professora e pelos colegas (Avaliar).
Análise dos dados
Os resultados do questionário foram analisados com o recurso ao programa Jamovi® versão
2.2.5. Para analisar as características psicométricas do questionário foi realizada
uma análise fatorial exploratória, utilizando extração de resíduos mínimos com rotação
oblíqua. A confiabilidade foi analisada através do cálculo do alfa de Cronbach () para o questionário e cada uma das dimensões.
Para facilitar a interpretação dos resultados agruparam-se as respostas dos alunos
aos vários itens do questionário pelas componentes do modelo as AAS e as AS. Como
os dados não apresentavam distribuição normal (p < .05), usaram-se testes não paramétricos.
Assim, para as AAS na comparação da utilidade dos recursos pedagógicos (slides e vídeos)
utilizou-se o teste de Wilcoxon. Na comparação das estratégias pedagógicas (síntese, quiz e questão) e na comparação dos indicadores (compreensão, autonomia, motivação e confiança)
usou-se o teste de Friedman e, posteriormente, para a comparação entre pares, o teste de Durbin-Conover.
Nas AS para comparar os indicadores (ampliação das aprendizagens, apoio da professora,
apoio dos colegas e papel ativo) e a utilidade das atividades (explicação da professora, atividades de Q&A, tarefas em grupo) usou-se o teste de Friedman e, posteriormente, para a comparação entre pares, o teste de Durbin-Conover.
Finalmente, para comparar a satisfação dos alunos na realização das tarefas das AAS com a realização das tarefas das AS
usou-se o teste de Wilcoxon.
Nas respostas dos alunos às questões abertas do questionário foi efetuada uma análise
de conteúdo categorial (), usando-se uma codificação mista composta por categorias fechadas (retiradas da
literatura) e emergentes dos próprios dados. Este processo ocorreu em três etapas:
pré-análise (organização do material), exploração do material (codificação, classificação
e categorização) e tratamento dos resultados (interpretação) ().
Os dados resultantes das interações dos alunos produzidas nas AS foram utilizados
para comparar o número de interações produzidas pelos alunos em cada atividade de
aprendizagem. Como cada AS estava dividida em dois tipos de atividades e a duração
das atividades variava ao longo das AS, bem como, o número de alunos presente, foi
necessário normalizar os dados. Para tal, dividiu-se o número total de interações
discursivas realizadas pelos alunos em cada atividade pela duração (em minutos) da
atividade e pelo número de alunos presente, obtendo-se o número de interações por
minuto por aluno.
Resultados
Análise das questões fechadas do questionário
As respostas dos alunos aos vários itens do questionário foram agrupadas pelas componentes
do modelo, na Tabela 1 estão as respostas relativas às Aulas Assíncronas (AAS) e na Tabela 2 as das Aulas Síncronas (AS).
Tabela 1.Respostas dos alunos aos itens relacionados com as Aulas Assíncronas (N= 22)
Itens
Respostas ordinais (n)
Outro tipo de resposta (n)
1
2
3
4
5
1.Tempo de preparação da AAS (minutos)
(0-20)
7
(20-40)
7
(40-60)
6
(mais de 60)
2
2. Avaliação da AAS (características mais e menos votadas)
Organizada
19
Útil
19
Completa
18
Extensa
5
Monótona
2
Complexa
1
3. Apoio da professora na preparação da AAS
1
0
3
6
12
4. Utilidade dos recursos pedagógicos disponibilizados na AAS
Slides/textos
1
0
0
13
8
Vídeos
1
0
0
15
6
5. Utilidade das estratégias implementadas na AAS
Síntese
0
2
1
4
15
Questão para o colega
0
3
3
10
6
Quiz
0
0
3
7
12
6. Contribuição da preparação da AAS no desenvolvimento de diferentes indicadores
Autonomia
1
0
3
5
13
Compreensão
1
0
2
3
16
Motivação
1
2
1
10
8
Confiança
1
0
6
9
6
7. Satisfação na realização das tarefas da AAS
2
1
2
8
9
Nota Respostas ordinais variam de 1 (Discordo totalmente) a 5 (Concordo totalmente)
Observando a Tabela 1 verifica-se que mais de metade dos alunos da turma fazia a preparação da AAS num
intervalo de tempo de [0; 40] minutos. Os aspetos que melhor caraterizam a AAS são
a sua organização e utilidade (19 alunos) e a caraterística negativa mais votada foi a extensão da AAS (cinco alunos). No que diz respeito à perceção dos alunos sobre o apoio dado pela professora durante a preparação da AAS, a maioria concorda que se sentiu apoiado (mais de metade
concorda totalmente).
A grande maioria dos alunos concorda com a utilidade dos recursos pedagógicos disponibilizados
(vídeos e slides) na AAS para a aprendizagem autónoma. Na comparação da perceção de
utilidade dos recursos pedagógicos, o teste de Wilcoxon mostrou não existir uma diferença estatisticamente significativa entre a perceção
de utilidade dos slides para a aprendizagem autónoma relativamente à dos vídeos [W = 14.00; p = .484].
No que diz respeito à perceção de utilidade das estratégias implementadas nas AAS
para a aprendizagem autónoma (síntese dos conteúdos, questão colocada aos colegas e quiz) verifica-se que um maior número de alunos expressa concordância com a utilidade
da síntesee do quiz (19 alunos) relativamente à questão (16 alunos). Na comparação da perceção de utilidade dessas estratégias, o teste de
Friedman mostrou existir uma diferença estatisticamente significativa entre elas [(2) = 11.11; p = .004]. O teste de Durbin-Conover mostrou que a perceção de utilidade do quiz é superior à da questão [D-C = 2.80; p = .008] e que não há diferença na perceção de utilidade do quiz e da síntese [D-C = 0.78; p = .438], por outro lado, a perceção de utilidade da síntese é superior à da questão [D-C = 3.58; p < .001].
No sentido de melhor analisar a contribuição da preparação das AAS no desenvolvimento
de diferentes indicadores, construiu-se o gráfico da Figura 1.
Figura 1.Aulas Assíncronas: caracterização dos indicadores desenvolvidos (soma e mediana)
Verifica-se, pela análise da Figura 1, que a compreensão e a autonomia são os indicadores mais pontuados e com valores mais altos de mediana, pelo contrário
a confiança foi o indicador menos pontuado, embora a sua mediana não difira do indicador motivação.
Na comparação da perceção de desenvolvimento desses indicadores com a preparação das
AAS, o teste de Friedman mostrou existir uma diferença estatisticamente significativa entre eles [(3) = 14.00; p = .003]. O teste de Durbin-Conover mostrou que a perceção de desenvolvimento da compreensão dos conteúdos é superior à perceção de desenvolvimento da motivação [D-C = 2.99; p = .004] e da confiança [D-C = 3.52; p < .001], mas não foi encontrada diferença estatisticamente significativa relativamente
à perceção de desenvolvimento da autonomia [D-C = 0.88; p = .382]. Por sua vez, a perceção de desenvolvimento da autonomia na realização das tarefas, com a preparação da AAS, é superior à perceção de desenvolvimento
da confiança [D-C = 2.64; p = .010] e à perceção de desenvolvimento da motivação [D-C = 2.12; p = .038]. Por fim, a perceção de desenvolvimento da motivação não apresentou diferença estatisticamente significativa relativamente à perceção
de desenvolvimento da confiança [D-C = .53; p = .599].
Tabela 2.Respostas dos alunos aos itens relacionados com as Aulas Síncronas (N= 22)
Itens
Respostas ordinais (n)
1
2
3
4
5
8. Existência de dificuldades de acompanhar a AS sem a preparação da AAS
1
0
1
4
16
9. Existência de participações mais eficazes na AS com a preparação da AAS
1
0
1
5
15
10. Contribuição do ambiente de aprendizagem da AS para os diferentes indicadores
Ampliação das aprendizagens
1
0
1
4
16
Apoio da professora
1
0
2
1
18
Apoio dos colegas
1
0
5
6
10
Papel ativo dos alunos
1
1
3
2
15
11. Utilidade nas diferentes atividades
Atividades em grupo
2
1
6
1
12
Explicação da professora
2
1
5
5
9
Atividades Q&A
2
6
5
5
4
12. Satisfação na realização das tarefas da AS
1
1
2
4
14
Nota Respostas ordinais variam de 1 (Discordo totalmente) a 5 (Concordo totalmente)
Observando a Tabela 2, verifica-se que a grande maioria dos alunos (20) exprime concordância com a existência
de dificuldades em acompanhar as AS sem a preparação das AAS e o mesmo número de alunos
considera que a preparação das AAS permitia participações mais eficazes nas AS.
No sentido de melhor analisar a contribuição do ambiente de aprendizagem das AS no
desenvolvimento de diferentes indicadores, construiu-se o gráfico da Figura 2.
Figura 2.Aulas Síncronas: caracterização dos indicadores desenvolvidos (soma e mediana)
A análise da Figura 2 mostra que o apoio da professora foi o indicador mais pontuado e com maior valor de mediana (5), pelo contrário o
apoio dos colegas foi o indicador menos pontuado e com menor valor de mediana (4).
Na comparação da perceção desses indicadores durante as AS, o teste de Friedman mostrou existir uma diferença estatisticamente significativa entre eles [(3) = 10.91; p = .013]. O teste de Durbin-Conover, mostrou que a perceção relativamente ao apoio de colegas é inferior aos restantes indicadores [(D-C(apoio de colegas-ampliação das aprendizagens) = 2.88; p = .005); (D-C(apoio de colegas-apoio da professora) = 3.18; p = .002) e (D-C(apoio de colegas-papel ativo) = 2.16; p = .035)]. Por outro lado, não foi encontrada diferença estatisticamente significativa
relativamente à perceção do apoio da professora e os restantes indicadores [(D-C(apoio da professora-ampliação das aprendizagens) = .31; p = .759) e (D-C(apoio da professora -papel ativo) = 1.03; p = .308)]. Nem na perceção de um papel ativo relativamente à perceção de ampliação das aprendizagens (D-C = .72; p = .474).
No que concerne à avaliação da utilidade das diferentes atividades propostas nas AS
para a aprendizagem dos alunos, as tarefas em grupo são as que apresentam maior mediana (5), seguidamente da explicação da professora (4) e das atividades de Q&A(3). Na comparação da utilidade das atividades propostas na AS, o teste de Friedman mostrou existir uma diferença estatisticamente significativa entre elas [(2) = 7.05; p = .030]. O teste de Durbin-Conover mostrou que a utilidade das tarefas em grupo é superior à utilidade das atividades Q&A [D-C = 2.71; p = .001] e que não há diferença na utilidade das tarefas em grupo relativamente à explicação da professora [D-C = .66; p = .516]. Por outro lado, a utilidade da explicação da professora é superior à das atividades Q&A [D-C = 2.06; p = .046].
Relativamente ao item satisfação, comparou-se a satisfação dos alunos na realização das tarefas da AAS (item 7) com as tarefas realizadas na
AS (item 12), o teste de Wilcoxon mostrou existir uma diferença estatisticamente significativa entre eles [W = 4.50; p = .025].
Análise de conteúdo às respostas abertas do questionário
A análise de conteúdo realizada ao discurso dos alunos nas questões abertas do questionário
permitiu identificar as categorias de análise que descrevem as AAS e AS.
Assim, relativamente às AAS a categoria com maior número de unidades de registo codificadas
foi a compreensão (11 unidades). Os alunos consideraram que as AAS foram muito úteis para melhorarem
o conhecimento inicial dos conteúdos - “são simples e acessíveis e facilitam a compreensão
da matéria” (aluno_C2). Além disso, alguns alunos destacaram o efeito positivo do
quiz na medida em que permitia aferir a qualidade do estudo autónomo - “permite-nos avaliar
se compreendemos bem ou não a matéria em questão” (aluno_C3). A satisfação (5 unidades), também surge associada às AAS e aparece descrita por aspetos relacionados
com o interesse dos alunos pela aula e o bem-estar que as tarefas proporcionaram -
“são interessantes e, por vezes, desafiadoras” (aluno_S3); “não vejo aspetos negativos,
acho que correu tudo bem” (aluno_S8). Os alunos consideraram que as AAS desenvolveram
a autonomia (4 unidades) - “tornaram-nos mais independentes” (aluno_A3). Por outro lado, os materiais
disponibilizados nas AAS alinhavam-se com os interesses e ritmos de trabalho dos alunos
(personalização da aprendizagem, 4 unidades de registo) – “era possível voltar atrás quando não entendíamos
algo” (aluno_P4); “conseguimos escolher em parte o nosso método de estudo” (aluno_P2).
No entanto, também, surgiram categorias relacionados com a falta de esclarecimento imediato (5 unidades de registo) e sobrecarga de trabalho (2 unidades). A falta de esclarecimento imediato descreve a perceção dos alunos de terem enfrentado dificuldades para obter respostas
às suas dúvidas durante as AAS, sentindo que o acesso à professora não era tão imediato
como nas AS – “um aspeto negativo é não termos a professora naquele momento exato
para tirar dúvidas” (aluno_F5). Já a sobrecarga de trabalho descreve aspetos relacionados com o trabalho excessivo que alguns alunos sentiram
na preparação das AAS - “sinto-me perdida com tanta matéria e tenho de fazer um esforço
extra para me organizar” (aluno_T1).
Relativamente às AS foram identificadas as seguintes categorias: consolidação de conhecimentos (21 unidades de registo), colaboração (4 unidades), satisfação (3 unidades) e limitações (5 unidades). Os alunos indicaram que na AS conseguiam mais facilmente retirar as
suas dúvidas e ampliar a compreensão dos conteúdos - “maior capacidade de compreender
de forma total a matéria” (aluno_C8). Na categoria colaboração foi destacada a utilidade
das tarefas realizadas em grupo. A categoria satisfação descreve sentimentos positivos dos alunos relativamente às AS – “cativantes” (aluno_S1);
“excelente alternativa para as aulas físicas” (aluno_S2). Por fim, a categoria limitações descreve aspetos negativos relacionados com os problemas técnicos associados às falhas
de internet.
Análise das contribuições discursivas dos alunos nas Aulas Síncronas
A Tabela 3 mostra o número de contribuições discursivas produzidas pelos alunos nos dois tipos
de atividades realizadas em cada aula síncrona.
Tabela 3.Contribuições discursivas dos alunos nas diferentes atividades da Aulas Síncronas
Aula síncrona
1
2
3
4
5
6
Atividade
1
2
1
2
1
2
1
2
1
2
1
2
N.º de alunos
11
4
11
4
11
4
11
4
11
4
11
4
N.º de Frases
42
32
55
44
73
61
31
62
53
103
32
125
Duração (min)
22.90
15.01
42.02
28.09
38.83
40.00
26.01
28.24
30.00
52.92
17.01
56.91
No sentido de melhor analisar as contribuições discursivas dos alunos em função do
design da atividade, construiu-se o gráfico da Figura 3.
Figura 3.Contribuições discursivas dos alunos em função do design da atividade
Verifica-se que o design da atividade influenciou a quantidade de interações que foram
produzidas. Como era previsível, a atividade 2 (tarefas em grupo) destaca o papel
dos alunos, pelo que o número de interações produzidas por estes aumentou relativamente
às interações produzidas na atividade 1 (tarefas conduzidas pela professora).
Discussão
Durante o encerramento das escolas, a transição do processo de ensino aprendizagem
para o contexto online foi uma alternativa possível às aulas presenciais. Nesse contexto,
implementou-se uma proposta do MFC, usando o modelo dos 5E no design das atividades
de aprendizagem. Para averiguar a adequação dessa proposta, ao contexto online, foram
recolhidos dados de um questionário e das interações produzidas durante as AS.
Os alunos consideraram que a sequência didática disponibilizada nas AAS contava com
recursos de aprendizagem (vídeos e slides) igualmente úteis (item 4), que se alinhavam
com os seus interesses, competências e ritmos de trabalho, contribuindo para a personalização da aprendizagem e a satisfaçãopara com as atividades. Estudos anteriores já indicaram que a flexibilidade de leitura
associada à componente pré-aula é uma das vantagens pedagógicas do MFC, pois a grande
variedade de formatos utilizados permite atender aos diferentes estilos de aprendizagem
dos alunos (). Além disso, também dá aos alunos um maior controlo da sua aprendizagem quer através
do ritmo e da frequência com que interagem com os conteúdos (), bem como através do feedback recebido. Nesse sentido, os alunos destacaram a utilidade
do quiz (item 5), dado que o feedback gerado lhes permitia decidir sobre a necessidade de
realização de maior ou menor aprofundamento dos conteúdos. Meta-análises recentes
sugerem que o MFC é mais eficaz quando avaliações formativas são usadas antes e/ou
na aula (; ). Assim, a par da flexibilidade de leitura dos materiais disponibilizados, o feedback
gerado pelo quiz teve repercussões no desenvolvimento da autonomia dos alunos (Figura 1 e categoria presente no discurso dos alunos sobre as AS). O estudo de vem sustentar esse resultado, na medida em que indicou que concorre para o desenvolvimento
da autonomia dos alunos, atividades de aprendizagem que possibilitam envolvimento
pessoal, alta flexibilidade de execução, baixa pressão e perceção de escolha.
A análise do questionário destacou também que os aspetos que melhor caraterizaram
a AAS são a sua organização e utilidade (item 2). Os alunos associaram a utilidade de preparação das AAS ao desenvolvimento
de uma compreensão inicial dos conteúdos (Figura 1 e categoria mais frequente no discurso dos alunos sobre as AAS) que, posteriormente,
se refletia num melhor acompanhamento das AS, dada a complementaridade entre as duas
(elevada concordância dos alunos nos itens 8 e 9). Para o processo de construção concetual
dos conteúdos contribuiu a síntese (item 5) que os alunos tinham de fazer dos materiais disponibilizados. Estudos anteriores
já indicaram que esses breves resumos podem fazer uma diferença significativa para
a eficácia da aprendizagem, dado que alguns alunos tendem a sonhar acordados ou perder
a noção dos vídeos que estão a assistir se não fizerem anotações (; ).
Relativamente ao tempo gasto na preparação das AAS, mais de metade dos alunos da turma
fazia a preparação num intervalo de tempo de [0;40] minutos. No entanto, os estudos
indicam que a preparação da componente pré-aula não deve exceder os 20 minutos para
evitar sobrecarga de trabalho e desânimo dos alunos (). Consequentemente, alguns alunos caracterizaram as AAS como extensas (item 2) e na análise de conteúdo do discurso dos alunos, ainda que com pouca frequência,
surgiu a categoria sobrecarga de trabalho.
Relativamente às AS, os alunos indicaram que o ambiente de aprendizagem aí desenvolvido
permitiu-lhes assumir um papel ativo durante as aulas (Figura 2), o que é corroborado pela análise da Figura 3 que destaca o elevado número de contribuições discursivas dos alunos nas atividades
em grupo (atividade 2) comparativamente à atividade 1. A avaliação dos alunos das
tarefas desenvolvidas nas AS alinha-se com esse resultado, uma vez que destacaram
a utilidade das atividades em grupo (item 11) relativamente às atividades de Q&A (atividade 1). Vários estudos indicam
que aumentar o tempo disponível para as interações com os pares em aula é principal
vantagem do MFC, dado que influencia o modo como os alunos se envolvem nas tarefas,
o que, por sua vez, afeta o nível de compreensão dos conteúdos (; ). Consequentemente, a ampliação das aprendizagens (Figura 2) foi outro dos indicadores desenvolvido nas AS. A análise do discurso dos alunos
sobre as AS sustenta este resultado, dado que a categoria consolidação de conhecimentos foi a mais frequente. No entanto, os alunos destacaram nas AS o apoio da professora (Figura 2) em detrimento do apoio dos colegas, corroborado pela avaliação de utilidade das atividades propostas que não encontrou
diferença significativa entre a explicação da professora e as tarefas em grupo. O que sugere que, embora os alunos apreciassem os momentos de interação com os colegas
(atividade 2), valiam-se da explicação e do apoio da professora para conseguirem concluir ou validar as tarefas propostas nas AS, não aproveitando
todo o potencial da aprendizagem colaborativa. Resultados semelhantes são descritos
por ) ao indicarem que o trabalho colaborativo e o apoio dos colegas são fatores que não
previram diretamente a experiência positiva dos alunos no MFC, ao contrário do suporte
e apoio do professor que é o maior preditor da satisfação dos alunos no MFC. Nesse
sentido, a falta de esclarecimento imediato (categoria identificada no discurso dos alunos sobre as AAS) pode ser a justificação
para a satisfação com as atividades das AS (item 12) ser superior à das atividades
das AAS (item 7).
Em termos de conclusão, este estudo destaca a utilidade do modelo dos 5E no design
das atividades de aprendizagem assíncronas e síncronas. Nas AAS, os recursos de aprendizagem
disponibilizados estavam alinhados com os interesses e ritmos de trabalho dos alunos,
possibilitando-lhes, de forma autónoma, construir uma compreensão inicial dos conteúdos.
Nas AS, as atividades desenvolvidas destacaram o papel ativo dos alunos na resolução
de problemas em grupo e a ampliação das aprendizagens iniciadas nas AAS. Porém, esse
processo de ampliação de aprendizagens apoiou-se mais no feedback imediato da professora
do que propriamente nos colegas de grupo. Pelo que investigações futuras devem debruçar-se
sobre o modo de alavancar o potencial da aprendizagem colaborativa no MFC em contexto
online.
Como limitações deste estudo, destaca-se o facto da plataforma Zoom® apenas captar
as interações discursivas da sala virtual em que a professora se encontrava, limitando
o número de interações a considerar. Além disso, a implementação desta proposta ocorreu
num contexto inédito, a pandemia, e o tempo de implementação foi curto o que poderá
ter condicionado os resultados obtidos. Interessa, portanto, que novos estudos similares
sejam implementados num cenário de normalidade social e educativa e com períodos de
implementação mais longos, o que potencialmente produzirá uma compreensão mais profunda
do efeito desta proposta na experiência de aprendizagem dos alunos.
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Notas
[*] Recebeu o prémio William James de Inovação Psicopedagógica 2023, concedido pela Asociación
Científica Internacional de Psicopedagogía (ACIP).